Eu perdi o meu Mojo.
No Verão passado, durante mais ou menos sete meses, eu estava imparável.
Imparável e irresistível, pensava eu.
Era estalar os dedos, e eles aterravam-me no colo.
Era só sorrir o meu sorriso mágico e eles caíam que nem tordos.
Ele era homens, carradas e carradas de homens - e lindos, veja-se - a implorarem pela minha atenção.
Foi um dia, sem saber como.
Talvez seja por não saber como que agora O perdi.
Sem saber como, tudo o que era dificílimo tornou-se fácil. Tudo o que era perro e doloroso tornou-se fluido e morno, como as águas de um ribeiro ao sol.
O mundo dos homens sempre foi para mim uma coisa muito estranha. Quando foi tempo de aprender o que era um rapaz, eu estava fechada a sete chaves num colégio de freiras e o tempo de aprender passou por mim lá fora, a rir-se do meu desterro.
Nunca me recompus.
O mundo dos homens ficou irremediavelmente coartado do meu, como um membro profundamente necessário ao corpo que nunca tem força para nascer.
Durante anos revolvi-me no caixão do meu desespero, mordendo as unhas de fome, inconsolável.
Todas as tentativas de falar a língua da terra-dos-rapazes saíam infrutíferas, ridículas, patéticas.
Nunca sabia aceitar com naturalidade um elogio, uma abordagem.
Nunca senti no corpo nem na mente que os rapazes, agora homens, são só pessoas de pilinha.
Mas no Verão passado.
Anos e anos a labutar sobre a desgraça. Horas, meses, noites de eterna angústia e degredo e de trabalho, também.
No fundo do poço do degredo, a resignação.
"Não são para ti, os homens".
No fundo da resignação, a imaginação. Os Homens-Imagem, como lhes chamei. Para disfarçar com requintes parvamente intelectuais a tristeza da minha vida sensorial.
O erotismo, esse, era riquíssimo.
Eram as sensações que me faltavam.
Até ao Verão passado.
No Verão passado, foi a alegria a inundar-me o corpo. A Alegria, como uma corrente de vento fresco e perfumado a acariciar-me o rosto sussurando-me que afinal, o mundo é pleno de bondade.
Eu bem me parecia que não podia durar.
Eu bem me parecia que a Grande Cabra, a Puta, a Cadela Nojenta, não ia demorar muito até me encontrar e recomeçar a farejar-me as cuecas, a empestar-me a cara de vergonha, a morder-me as canelas que mal tinham recomeçado a cicatrizar.
A grande Cabra diz-me que afinal sou feia como era, magra e horrível como era; que não tenho direito a nada.
Não sei se ela já espreita por trás do território do Amante.
O Amante é o único homem que me resta, depois da debandada.
O Amante é, por agora, o único homem que ainda acredita nesse corpo que nasceu no Verão passado.
Mojo, volta por favor.
Mojo, não me deixes aqui com esta puta de merda a infernizar-me a vida.
Mojo. Por favor. Eu amo-te.
Volta.